15/03/2010

O design que salvou a Ford





(texto originalmente escrito para o blog do Quarto Prêmio Quatro Rodas de Design)

É possível um só projeto desviar uma marca do caminho da falência? O Ford de 1949 provou que sim.

Recapitulando...

Fim da Segunda Guerra, a Ford ia mal das pernas. Edsel Ford morrera em 1943, obrigando o velho (e já senil) Henry a assumir o comando. Só que os tempos não eram mais os do Modelo T, e Ford deixava tudo na mão de seu braço-direito, um cara barra-pesada que diziam ter bom trânsito junto aos sindicatos. Mas a má gestão ameaçava os contratos de produção de armamentos, e foi preciso dispensar Henry Ford II (o filho mais novo) do serviço militar -- ou a Ford ia para o buraco.

Henry Ford II assumiu, botou Harry Bennett (o barra-pesada) na rua, reuniu uma equipe de gente competente e começou a trabalhar. Era preciso dar cara nova ao Ford. O design do carro vinha mudando muito devagar desde o Zephyr, e estava positivamente datado. Mas as coisas iam mudar, e muito.

Numa primeira fase Eugene Gregorie, o estilista-chefe da Ford, apresentou seu projeto. A equipe o achou exagerado para um Ford, decidindo que seria bom para o novo Mercury. Mercury resolvido, mas o Ford era assunto urgentíssimo, e a equipe resolveu buscar ajuda fora de casa. Chamou George Walker (que mais tarde assumiria o cargo de Gregorie), Elwood Engel, Joe Oros, Bob Bourke e Holden Koto (do escritório de Raymond Loewy) e Dick Kaleal, contratado de Walker. Cito todos esses nomes pelo trabalho que realizaram e pelo crédito que justamente merecem.

A turma deu duro, fez serão, e por fim apresentou quatro modelos em escala. A equipe de Ford II escolheu um, e pediu que fossem usados detalhes dos outros. Gregorie não gostou (não foi dele o escolhido) e pediu o boné. Mas o projeto Ford foi em frente, e dezenove meses se passaram do conceito à produção.

O carro impressionava, por fora nada em comum com o Ford de 1948 (e requentado desde 1940). Comparado aos da GM, bem menos escultural -- mas de estilo muito mais limpo. Laterais lisas, a não ser por uma discreta saliência que terminava nas lanternas. Paralamas totalmente integrados às laterais, e estas quase fundindo com o miolo capô/cabine/porta-malas, o que lhe valeu o apelido de "caixa de sapato". Intriga da oposição, pois o Ford era de longe mais moderno que os GM -- e os da Chrysler então nem se fala.

Design prático, que fazia o carro parecer maior que o modelo de 48, embora fosse mais curto e mais estreito; bem mais confortável também: o centro de gravidade mais baixo e o motor mais à frente garantindo mais espaço para os ocupantes.

Devido ao curto prazo de planejamento-produção, saiu da linha de montagem com diversos problemas. A Ford foi rápida na correção do curso, e o modelo fechou o ano à frente do Chevrolet. Um recorde que a Ford não batia desde 1930.

Nem tudo é perfeito. O famoso "nariz de bala", inventado por Kaleal, prejudicava o aspecto horizontal do desenho, marcava demais o centro do capô. Foi defendido desde o começo, pois conferia personalidade ao carro. Ah, o poder do ornamento... O "nariz de bala" foi repetido no ano seguinte, mas diminuiu e foi embutido, virou um par dentro da grade no desenho de 51.

Valeu o investimento. A Ford tirou o pé da lama e fez frente à poderosa GM. Cresceu, e ficou tão confiante que na década seguinte resolveu criar uma nova divisão -- Edsel. Mas esta história eu conto depois.

Interessante filmete que embora incompleto, mostra todo o desenvolvimento do Ford 1949; desenhos, o modelo em argila, o estúdio, o desenvolvimento, os testes e até as fresas: realmente um prazer assistir.

4 comentários:

  1. nice work brother could you post some wire please :D .

    i like that black one :D.

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  2. Dan, grande iniciativa este post, acho que somos igualmente fascinados pelo mesmo carro.
    Esse automóvel e sua história têm me ocupado muito nos ultimos anos. Tenho gasto tempo e feitos bons amigos na empreitada de aprender mais sobre sua história que, como você tão bem resumiu, é rica em desafios, genialidade, talento e alguns mistérios.
    São tantos que me parece que isso se deve ao fato de que esse desenho realmente veio da Studebaker, como é dito mas não provado há décadas. Quanto veio, como e por quem, não se sabe.
    Recentemente a Hemming's liberou na internet uma parte de um artigo de um dos seus editores que traz novas suposições à luz do dia, mas deixa o mais importante de fora: as provas desta afirmação. Esse artigo você pode ler no blog que mantenho sobre os Shoebox, aqui neste endereço: http://shoeboxford.wordpress.com/2010/02/20/did-the-1949-ford-really-begin-life-as-a-studebaker-design/
    Mas, o melhor artigo sobre a história e o desenvolvimento destes carros, ainda é o furo jornalístico da Popular Science em junho ou julho de 1948, cujas cópias, infelizmente, eu não tenho completa, faltam algumas páginas. Eis o endereço: http://shoeboxford.wordpress.com/2010/03/04/popular-science-july-1948/
    Mas isso tudo é pouco perto da genialidade daqueles que projetaram este carro. Para mim, um ícone seminal em 100 anos de automóvel. E, cá pra nóis, bonito para caramba!
    Eu adoraria - olha a cara de pau... - ver suas maquetes eletrônicas de todos eles, de 49 a 51. Quem sabem um dia?
    Abraço, Nik.

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  3. Dan, uma entrevista com o George Walker, já no fim de sua vida:
    http://shoeboxford.wordpress.com/2009/12/02/the-reminiscences-of-george-w-walker/

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  4. Opa, vou lá conferir.
    Que carrão bonito o seu hem Nik! Repare como a "bala" duplicada aumenta visualmente o carro, truques do design daquele tempo...

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